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Jairo Bouer

Tendência a trapacear aumenta durante crises econômicas?

Jairo Bouer

02/08/2019 15h51

Trapacear para levar vantagem financeira é algo ligado à natureza humana ou é fruto do ambiente em que a pessoa vive? Será que em épocas de crise econômica as pessoas são mais propensas a trair a confiança de alguém, com a desculpa de que é preciso sobreviver?

Uma equipe de pesquisadores da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, decidiu mergulhar nesse assunto, e concluiu que a propensão a enganar alguém para obter dinheiro tem mais a ver com uma inclinação interna do que com fatores externos.

Ao longo da história da humanidade, a conduta de muitos criminosos foi atribuída às circunstâncias em que essas pessoas foram criadas ou à falta de acesso a educação. Mas outras pessoas acreditam que o que interessa, mesmo, é o caráter.

Para testar as hipóteses, os pesquisadores escolheram uma comunidade remota na Guatemala para realizar um experimento. Os moradores daquele local dependem exclusivamente da produção de café para sua subsistência. Durante a colheita, há abundância. Mas, durante cerca de sete meses do ano, a comunidade convive com a escassez de recursos.

Os participantes foram convidados a participar de um jogo com dados em que havia a possibilidade de mentir para receber mais dinheiro. Eles foram informados de que não seriam punidos caso decidissem mentir, já que aquilo era apenas um teste. O experimento foi realizado durante a fase de colheita e, depois, repetido na época de vacas magras.

A tendência a trapacear ou não permaneceu exatamente a mesma em ambos os períodos. Os participantes ainda tiveram a opção de mentir para beneficiar alguém do mesmo grupo, e a tendência foi semelhante – cerca de metade dos participantes foram desonestos nas duas fases.

Os participantes também jogaram com um grupo externo, e, então, podiam mentir em relação aos dados para beneficiar um estranho. Na época de abundância, a tendência foi não trapacear. Já na época de escassez, alguns sujeitos mentiram para beneficiar o desconhecido. Em outras palavras, quando as pessoas ficam mais pobres, tendem a ser mais generosas.

Como em nenhum momento a escassez interferiu na propensão a mentir em benefício próprio, os pesquisadores concluíram que questões internas contam mais do que o ambiente econômico. Os autores dizem que experimentos semelhantes foram realizados em 23 outros países, com resultados parecidos. Mas é bom lembrar que a pesquisa envolve simulações, e não situações reais, do dia a dia.

Sobre o autor

Jairo Bouer é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e bacharel em biologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Fez residência em psiquiatria no Instituto de Psiquiatria da USP. Nos últimos 25 anos tem trabalhado com divulgação científica e comunicação em saúde, sexualidade e comportamento nos principais veículos de mídia impressa, digital, rádios e TVs de todo o país.

Sobre o blog

Neste espaço, Jairo Bouer publica informações atualizadas e opiniões sobre biologia, saúde, sexualidade e comportamento.